domingo, 9 de agosto de 2009

Nossos Abismos



"Há momentos na vida de um homem em que ele beira seus limites; é como se fosse a borda de um abismo: um passo à frente e a queda é irreversível. Mas poucos homens são capazes de reconhecer esta linha tênue quando a encontram; chegam a cair em seus abismos sem perceber; a vida se transforma, mas não se é capaz de conhecer o preciso instante em que ela começou a mudar. Assim, a maioria dos homens constrói sua vida com retalhos os mais diversos, e termina-a como um manto de remendos onde é impossível reconhecer o menino no ancião.

Alguns homens, não; têm a sorte, ou o azar, de perceber e identificar cada ponto limite de suas vidas; sofrem, tremem, escolhem. São lúcidos, são homens para quem a existência é mais penosa, pagam caro sua própria lucidez. Pierre estava em seu momento mais crucial; abandonava sua identidade, como a cobra abandona a pele desgastada depois do inverno; mas não sabia se o verão lhe traria uma pele nova e fresca. O passo já havia sido dado; não se conhecia ainda a profundidade do abismo, mas Pierre já se sentia viajando pelo espaço, caindo em direção ao fundo, como um meteoro nascido da explosão de estrelas distantes."


Trecho do livro "O Rastro do Jaguar", de Murilo Carvalho

Um comentário:

Eva disse...

Já passou um mês e o tempo já não está tão quente - portanto toca a escrever!