quarta-feira, 27 de maio de 2009

Fornication Under Consent of the King

Casamento gay. De repente é um assunto muito em voga. Há heterossexuais a favor e outros contra. Há mesmo gays contra o casamento gay. A igreja, como é óbvio, é contra. Os partidos de direita são contra, os de esquerda mais de extrema, são a favor, os partidos "neutros" não se manifestam ou se enterram com desculpas esfarrapadas.

As pessoas podem e devem ter opiniões, estarem contra ou a favor do que bem entenderem. Isso não me incomoda. O que me incomoda é o preconceito infundado, que existe para todo o lado e é um dos maiores defeitos humanos. Porém o estrago que faz chega a ser indecente. O preconceito tem o poder de destruir a vida de qualquer pessoa, seja ela gay, negra, hispânica, imigrante, cigana, desabrigada, doente, solteira, divorciada, religiosa, atéia, vegetariana, prostituta, virgem...nossa, é melhor parar, pois a lista é interminável. É de se estranhar que o preconceito não tenha sido um dos 7 pecados capitais. Provavelmente a preguiça deve fazer muito mais mal ao próximo do que o preconceito. Ou a igreja não quis dar um tiro no pé... O preconceito é inerente ao homem, e admiro muito aquele que não tenha um pingo de preconceito. Eu tenho vários, mas juro que a cada dia eu tento acabar com pelo menos um deles.

Moving on... Há quem diga que não tem preconceito algum, mas que o casamento é a benção de Deus/igreja ao matrimônio, e que isso é para ser entre um homem e uma mulher porque está escrito assim. Outros dizem achar deprimente que os gays, tão liberais, lutem por um direito tão conservador como o casamento.

Ahá! Era aí que eu queria chegar: DIREITO, ou sem muito rodeio, DIREITO DE AMAR. De repente há pessoas aí querendo proibir outras pessoas de amar, e de viver junto com quem ama, e de se casar com a pessoa amada. E de ter os direitos que toda a pessoa amada e casada tem. O ser humano terá muito que aprender para chegar ao ponto em que não precise proibir outro ser humano de amar quem quer que seja. E para aprender de uma vez por todas que, querendo ou não, ninguém consegue proibir um ser humano de amar quem bem entender.

até lá, achei óptima a letra da música da Lily Allen "Fuck You" e do que o http://www.GayClic.com fez com ela no dia mundial de combate a homofobia (17 de Maio, anota aí, nem eu sabia!)




Fuck You (Very Much)
Songwriters: Allen, Lily Rose; Kurstin, Gregory; Look inside, look inside your tiny mind

Look inside
Look inside your tiny mind
Now look a bit harder
Cause we're so uninspired,
so sick and tired
of all the hatred you harbour.


So you say it's not okay to be gay
Well, I think you're just evil
You're just some racist who can't tie my laces
Your point of view is medieval

Fuck you, fuck you very, very much
'Cause we hate what you do
And we hate your whole crew
So please don't stay in touch

Fuck you, fuck you very, very much
'Cause your words don't translate
And it's getting quite late
So please don't stay in touch

Do you get, do you get a little kick
Out of being small minded?
You want to be like your father
It's approval you're after
Well, that's not how you find it

Do you, do you really enjoy
Living a life that's so hateful?
'Cause there's a hole where your soul should be
You're losing control a bit
And it's really distasteful

(chorus)

You say you think we need to go to war
Well, you're already in one
'Cause it's people like you that need to get slew
No one wants your opinion


(chorus)

Tradução em português aqui

Outro vídeo interessante é o IDAHO 2009: One Voice, One Message, Heard Around the World

terça-feira, 26 de maio de 2009

Andrew Bird, o Andy Warhol da música!


Faz pouco que voltei do concerto do Andrew Bird. Há meses tinha o bilhete comprado, segunda fila, bem pertinho mesmo! Ele em palco é multi, um senhor orquestra! Toca vários instrumentos, (violino, guitarra, xilofone e assobia), cria loops, camadas da própria música dele, criando uma sinfonia fantástica e hipnotizante. Ele erra em palco, aperfeiçoa, brinca com o publico, dialoga, conta histórias, elogia lisboa (ultimamente todos os cantores tem elogiado Lisboa, by the way). Ele disse que se Portugal fosse o único país em que o ouvissem, ele já se dava por satisfeito. Voltou 2 vezes no bis. Ele é muito tímido, mas não durante o concerto. Está certo que ele passa muito tempo de olhos fechados, e muito do show ele passa mundo musical dele, a fazer música-arte. Mas em palco ele está super à vontade e só vemos a timidez dele nos segundos em que ele começa e termina o concerto.
Depois do show, apareceu de surpresa ao lado da barraquinha do Merchandising. Grande marketing! Deu autógrafos, e coisa mais querida, perguntava o nome de cada um. Pena que não era só eu lá. Vamos combinar, não dá para conversar com 50 neguinhos querendo o autógrafo do homem, certo? E pena que ele ouviu mal o meu nome, pois autografou "Cladio"(ou o "u" é mesmo minúsculo). Tudo bem, ele é queridinho demais para eu ficar chateado com isso :)

As fotos do show estão aqui

De 20090525 Andrew Bird at Sao Jorge

E aqui um dos vídeos que eu fiz, da música Natural Disasters.


sexta-feira, 15 de maio de 2009

Antony, entre a luz e lugar nenhum

Hoje fui ao concerto do Antony and The Johnsons .Há 6 meses atrás eu achava as letras de música dele muito deprimente. Há 3 meses atrás eu odiava a voz dele. Eu fui quase obrigado a ir ao show. Mas desde há 6 meses atrás comecei a gostar mais de Rufus Wainright , depois apaixonei-me por Andrew Bird , e destes dois tipos para passar a gostar do Antony foi um demorado pulinho. Comecei a prestar atenção às letras e descobri que afinal elas eram escritas com alma, com coração, com um sentimento que abrangia o meu.

Para complementar, em palco. Antony é um desvairado. É uma figura inesperada, uma diva gorda horrorosa, mas extremamente doce, gay e simpática. (Atenção que doce+gay+simpática ganha de diva+gorda+horrorosa). Ele canta tão perfeitamente que fica melhor que o album gravado. Tem um controle e pureza de voz e um fluência na pronúncia das palavras que a gente sente vontade de beijá-lo agradecendo tanta perfeição. E ele delira entre às músicas. Fala do degelo da crosta polar, e de como ele se sente "broken", pois ele veio da natureza e sente que não pode fazer o suficiente para retribuir. Fala da segunda vinda de Cristo, em forma de mulher e em uma caverna no Afeganistão. E isso que ele não é católico. Nasceu católico, mas virou uma bruxa, como ele mesmo diz.

E eu só pensava em como faz falta este tipo de maluquez de vez em quando. Ou de como essa maluquez já faz parte de mim e de como eu a critico, e que só uma pessoa tão transparente como o Antony é capaz de falar de tudo, de coisas absolutamente absurdas como se fossem a coisas mais normais do mundo e chegamos a pensar que chegará um dia em que diremos: ele tinha toda a razão!

E aqui a música que eu, e quase todo o público que estava lá hoje, gostamos mais.

Hope There's Someone

Hope there's someone
Who'll take care of me
When I die, will I go

Hope there's someone
Who'll set my heart free
Nice to hold when I'm tired

There's a ghost on the horizon
When I go to bed
How can I fall asleep at night
How will I rest my head

Oh I'm scared of the middle place
Between light and nowhere
I don't want to be the one
Left in there, left in there

There's a man on the horizon
Wish that I'd go to bed
If I fall to his feet tonight
Will allow rest my head

So here's hoping I will not drown
Or paralyze in light
And godsend I don't want to go
To the seal's watershed

Hope there's someone
Who'll take care of me
When I die, Will I go

Hope there's someone
Who'll set my heart free
Nice to hold when I'm tired



PS: Sim, eu devo desculpa à alguéns por ter duvidado do seu bom gosto. Desculpem-me!!!

terça-feira, 5 de maio de 2009

Quem vê ternura não vê espinho

Recebi estas fotos hoje por e-mail, e foi amor à primeira vista. Nunca na minha vida teria imaginado que um animal todo repleto de espinhos pudesse ser o ser mais fofo da face da terra. Eu quero um ouriço, e não me importo que de vez em quando eu fique com as mãos picadas, o rosto arranhado, que de vez em quando eu não possa abraça-lo ou beijá-lo, principalmente quando ele estiver "eriçado". Eu aguento os espinhos, já que qualquer arranhão que ele me faça, será absolutamente sem querer.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Quando o Amor Termina



Quando o amor termina, há despressurização do ar. Perdemos o chão e somos lançados para todas as direcções, sem podermos nos agarrar a nada, não por má vontade, mas porque nada consegue nos manter em terra por muito tempo.
Quando o amor termina somos destituídos de toda a nossa bagagem de uma longa viagem, e às vezes nem temos tempo de trazer uma mala de colo. Por outro lado, quando o amor termina, há de se aliviar o peso, perder a bagagem, pois, se tivermos alguma sorte, ainda teremos força somente para carregarmos a nós mesmos. Devemos simplificar nossas horas, nossos dias, porque a energia se desvanece com facilidade. Temos de nos preservar.
Quando o amor termina, tempos direito a choro infinito, a colo, a mimos, a tudo que sirva para nos apaziguar. Chorar muito até não haver mais razão para tal.
Quando o amor termina, assim que pudermos, é mister que nos perdoemos, antes que nos enchamos de culpa por algo que não poderíamos ter controle, antes que culpemos outros pelo que não podemos nos culpar. Temos de seguir em frente e, na impossibilidade, seguir para cima, para baixo, para os lados, não importa para onde, só não devemos nunca voltar para trás. O que está atrás é imutável, é doloroso, é passado. Se tentarmos mexer no passado, o passado voltará a mexer connosco.
Quando o amor termina, temos de dar um tempo do amor. Cada amor é único, singular, irrepetível, irreproduzível. Para voltar a amar, temos que desaprendê-lo antes. Amar é a única coisa que não se reaprende com lições passadas.
Quando termina o amor deves lembrar que antes do amor, tu existias. E foi contigo e por ti, que o amor começou.

Maybe California

Tori Amos, uma das minhas musas, irá lançar um novo disco chamado "Abnormally Attracted to Sin", no dia 15 de Maio.

Como ela é adiantada, já há vídeo e tudo de uma das músicas do disco online. Um encanto! Vejam e ouçam por si!

Ah, e aqui está a música para download, presente da própria Tori pelo dia das Mães.



E o que a Tori diz sobre o vídeo:

"There are people in our lives, and we all know them, that are able to give even in the darkest of times, even when they seem depleted. But somehow by giving, they gain this magical light. Even the most giving person needs a gift every once and a while, just to know they are seen and appreciated. 'Maybe California' is my gift to you."

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Twitter ou não Twitter, eis a questão!


Muitas pessoas me perguntam o que é o Twitter e para que serve. Eu até tento explicar, mas não é fácil, pois nem eu mesmo sei direito ainda o que é o Twitter e para que ele serve. Mas já consigo ver todas as possiblidades dele, as quais irei listar.

Basicamente o Twitter é um mini-blog, mini porque só podem ser postadas mensagens de 140 caracteres, e não podem ser postadas nem imagens e nem vídeos, a não ser referências a estes. Assim que uma pessoa cria o seu perfil, ela terá uma "timeline". Tudo que ela postar estará na sua timeline, por ordem de postagem. Sempre que essa pessoa entrar no Twitter, tudo que ela postou estará lá. Mas até agora tudo parece muito chato, não? Então vamos complicar.

No Twitter há os seguidores e os seguidos. Seguir uma pessoa é adicioná-la ao seu timeline. Tudo que a outra pessoa postar, aparecerá no teu timeline também. E vice-versa, se alguém decidir te seguir. Quantos mais seguidores, mais updates haverá na tua timeline.

Actualmente eu tenho uns 35 seguidos e 14 seguidores, o que não é nada comparado a outros desconhecidos. De qualquer maneira, eu escolho quem eu sigo pelos seguintes requisitos:

a) é amigo ou conhecido;
Em Portugal e no Brasil são muito poucos os amigos no Twitter, infelizmente. E os que estão não costumam actualizar. Se actualizassem, seria bom saber, mesmo que por cima, o que meus amigos andam a fazer. Não quero saber se estão a almoçar ou trabalhar, mas saber o que estão a ler, que programa estão a assistir, onde foram, o que encontraram na internet de interessante, coisas assim. De qualquer maneira, o twitter é muito publico para falar-se de coisas muito privadas, portanto, saber-se-ão só este tipo de trivialidades mesmo.

b) é famoso e eu acho interessante;
Neste momento estou a seguir a cantora Maria Rita, a Diablo Cody, roteirista-guionista do filme Juno, Davida Lynch, o criador do Twim Peaks, o Rafinha Bastos, Bruno Nogueira e acho que é só. Tinha a Ellen Degeneres, mas ela só falava das atrações do programa dela, e como não passa aqui, não me interessava e deixei de a seguir. A Maria Rita escreve coisas do tipo "o Show foi muito bom, valeu" até "estou fazendo as minhas unhas, bem, só pintando, mas conta como fazer unhas, não?". Ela até já me respondeu uma mensagem privada. Coisa mais fofa! A Diablo Cody escreve loucuras engraçadas e reclama das reuniões dela sobre filmes. São assuntos diferentes e interessantes, por isso gosto de ter estes bocadinhos da vida deles.

c) tem algo que me interessa, seja um interesse em comum, a aparência, o trabalho,...
No Twitter pode-se fazer pesquisa por qualquer assunto. Posso pesquisar por uma música, um cantor, uma actor ou um tema, e a partir daí investigar as pessoas que aparecem no resultado. Se me interessarem, começo a seguí-las. É assim que adicionei um barman de Nova Iorque, um poeta da Inglaterra, uma editora de livros de Lisboa e um criados de jogos de computador e consolas. Outras que adicionei já foram a vida, principalmente porque postavam exageradamente, 99% das coisas não me interessavam, eram Retweets e só estavam a encher a minha timeline.

d) alguém que me adicionou e achei interessante.
E, finalmente, alguém que não me connhece de lado algum pode me adicionar e se eu também achar esta pessoa interessante, a adiciono.

Mas e aí? Tenho minha timeline, meus seguidos e seguidores. E agora?

Agora é descobrir o que queremos fazer, ou o que gostamos de fazer. Eu comecei a interagir com alguns dos meus contactos. Pode-se enviar mensagens as pessoas, que normalmente respondem, mesmo as mais famosas. Não é nenhuma intimidade, mas é bom saber algumas das coisas que estão a acontecer enquanto eu faço as minhas.

Como temos interesses em comum, eles mencionam uma reportagem, um evento, uma música, algo que normalmente chama a minha atenção. E podemos fazer um ReTwitt com o Twitt de alguém. O twitt é o post que a pessoa fez. Se eu achei aquele twitt interessante o suficiente para os meus seguidores também tomarem conhecimento, eu faço um RT (ReTwitt), que é como uma citação ou um forward. Assim os meus seguidores sabem o mesmo que eu e conhecem também o autor do twiit.

Outras utilidades é fazer pesquisas de mercado ou opinião, mas só funciona, é claro, se tens um número de seguidores considerável. Também se queres saber o que os twitters estão a pensar sobre algum tópico, é só pesquisar. Encontra-se tudo.

Eu tenho o twitter no telemóvel/celular, mas não posto muito ali. Costumo sim ler os posts dos que sigo. No Firefox adicionei o complemento TwitterFox, que mostra popups conforme o twitter é actualizado. E agora passei a usar também o TweetDeck, que facilita muito a vida para responder, escrever posts com links, fazer retwitt e outras ações. É muito prático e fácil de usar.

E também há sempre a página do twitter. www.twitter.com. Lá também se faz tudo isso.

Sinceramente, no momento acho o Twitter interessante e curioso. Ainda estou a começar, e logo decido se continuo ou não. Mas estou a gostar do que vi até agora.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Tears for Fears?


Passaste por mim falando ao telefone. Estavas triste e choravas. Fiquei a imaginar o que poderia ter acontecido. Se teu namorado, ou namorada, estava a terminar o namoro contigo, se tinhas tido problemas no trabalho, se a faculdade era um fardo muito difícil para ti, ou até a vida.... nunca se sabe. Talvez tivesses alguém doente, ou alguém que se foi sem se despedir. Ou estavas a prever que alguém iria embora e não podias fazer nada. Ou fosse pânico, ou saudade. Talvez fossem teus pais a te incomodar. Ou a não te aceitarem como tu és. Ou talvez ainda estivesse a pedir perdão a alguém. Às vezes a gente chora a pedir perdão, por isso pensei nisso.

Não falei nada porque não te conhecia. Mas já me arrependi. Prometo que se alguém voltar a passar por mim a chorar, eu tentarei ajudar de alguma forma e não ficar só a adivinhar, mesmo que não o conheça. A partir daí logo se vê.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

E por falar em Clarice!

Por que se fala tanto de Clarice em Lisboa, especialmente esta semana.

 

“...sentou-se para descansar e em breve fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que que dela não estava em silêncio alvíssimo escorrendo sangue escarlate, e que ela não estivesse pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz de conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz de conta verde-cintilante, faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava de morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus,..., faz de conta que vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos de perplexidade quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de corda de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua pois ela era lunar, faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos de gratidão, faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta, faz de conta que se descontraía o peito e a luz douradíssima e leve a guiava por uma floresta de açudes mudos e de tranqüilas mortalidades, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando por dentro...”

 

Clarice Lispector, retirado do Livro “Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres, 1969

 

Carta para Clarice

Carta de Fernado Sabino  (Fernando Sabino)

Nova York, 06 de julho de 1946.

Clarice,

Porisso (sic) não te posso mandar nenhuma palavra animadora. Digo apenas que não concordo com você quando você diz que faz arte apenas porque “tem um temperamento infeliz e doidinho”. Tenho uma grande, uma enorme esperança em você e já te disse que você avançou na frente de nós todos, passou pela janela, na frente deles todos. Apenas desejo intensamente que você não avance demais para não cair do outro lado. Você tem de ser equilibrista até o fim da vida. E suando muito, apertando o cabo da sombrinha aberta, com medo de cair, olhando a distância do arame já percorrido e do arame a percorrer — e sempre tendo de exibir para o público um falso sorriso de calma e facilidade. Tem de fazer isso todos os dias, para os outros como se na vida não tivesse feito outra coisa, para você como se fosse sempre a primeira vez, e a mais perigosa. Do contrário seu número será um fracasso.

Fernando.